sábado, 19 de dezembro de 2009

Talvez




"Sentir o calor humano a quebrar o inverno."
É bom.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Encanto


Estarei a cair novamente naquilo que de mais poderoso existe no universo, nessas teias que nos entrelaçam e agarram, e nos fazem sucumbir? Não sei explicar ao certo o que se passa, e talvez essas coisas tenham sido feitas mesmo para não serem explicadas. Mas eu preciso de compreender, eu preciso sempre de compreender. Começo a sentir de novo uma essência conhecida. Ele encanta-me, e muito, é certo. Mas será que estou preparada para que ele passe a mais do que um encanto passageiro na minha vida?

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

É estar saturada disto e não estar



Eu pergunto-me tantas vezes se é mesmo esta a direcção que quero tomar, se estou no caminho certo para mim. E nunca encontro qualquer resposta, eu sou uma vazão imensa por dentro. Afinal aos dezoito ainda somos tão inocentes como aos quinze. Aos dezoito ainda buscamos as respostas às nossas questões mais que existenciais, ainda tentamos encontrar a pessoa que um dia seremos. E eu sou tão dual que isso se torna uma tarefa complicada. Preciso de encontrar um rumo, algo que saiba que vou perseguir e conquistar, faltam-me objectivos para cumprir. Estou demasiado desnorteada. E deslumbrada, muito deslumbrada. Isto são anos passageiros, mas são tão surreais que se torna difícil ser quem era e comportar-me como me estereotiparam. E depois encontro todos à minha volta a mudarem. Já não reconheço ninguém. A vida académica tem efeitos desconcertantes nas pessoas, incluindo em mim. A sério que preciso de um rumo, de alguém que me norteie. E finalmente reconheço que estou carente no meio de tanta e tanta gente espectacular que me rodeia. O que é perturbador.


Eu julgo que tenho tudo para ser feliz. Mas não o sou. Ora, é porque algo está errado. Mas o quê?

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Sempre

Descobri que nem os novos ambientes, nem a tua ausência física e visual, nem os amores de uma só noite me fazem deixar-te para trás, nada me faz esquecer-te de uma vez por todas. Já estás muito menos, já me lembro poucas vezes de ti, já não pulsa aquela sensação de que és tudo para mim, mas mesmo assim cada vez que retornas à minha mente, retornas em grande força. Destróis sempre todas as certezas que tenho, alimentas a saudade. Não há nada que me faça esquecer-te por completo, julgo que nunca ficarás definitivamente no passado. E isso é absolutamente estúpido.

domingo, 18 de outubro de 2009

Prima *


Tu sabes que nunca te deixei para trás, nem nunca serei capaz de o fazer. Ou devias saber. Acredita, és quem mais me faz falta nesta nova fase da minha vida, estivesses lá comigo e tudo estaria completo. Assim não há perfeição. Nunca fui tão feliz como agora sou, é certo. Tudo o que acontece, todo o novo contexto, todas as novas pessoas, fazem os meus dias serem excepcionais. Mas não duvides que em muitos momentos eu penso que faltas lá tu, que te quero lá também. Para mim não é a distância e ausência física que fazem com que as pessoas se afastem, são os actos, os pensamentos e a tentativa de esquecimento. E eu tenho-te relembrado sempre, podemos não estar juntas fisicamente, mas estás sempre comigo em pensamento, podes dizer que isto é dito da boca para fora, que é frase feita, mas não é, é a pura realidade. Tudo farei para não deixar a nossa amizade cair por terra. És demasiado essencial, já me tinha apercebido disso há muito tempo, e talvez agora perceba ainda melhor. Amigas como tu simplesmente não se esquecem, não se deixam para trás. Conservam-se para toda a vida, porque são as que valem a pena ficarem sempre connosco. Eu podia até estar na China e ver-te só de cinco em cinco anos que ainda assim não te esqueceria. Acredita, mas acredita mesmo, que por mim ficaremos sempre as melhores amigas, que seremos sempre as primas adquiridas, que teremos sempre as conversas palermas que só nós somos capazes de ter, que teremos sempre as mesmas pancas, que teremos sempre aqueles momentos completamente parvos, que nos riremos muito e muito e muito juntas, que daremos sempre conselhos uma à outra, que desabafaremos sobre tudo o que precisamos, que faremos tantas mais coisas. As nossas coisas, à nossa maneira completamente parola. Não me desiludas, não tentes pensar que te esqueci ou te deixei para trás, porque nunca o farei. Juro. Promessa de prima desnaturada.
Estiveste, estás e estarás sempre, melhor prima «3

domingo, 4 de outubro de 2009

Saudade


Eu procurei um novo caminho, a mudança de tudo o que estava estabelecido.
Mas agora sinto falta de tudo o que em tempos julguei possuir.

sábado, 12 de setembro de 2009

Que tudo mudasse


A verdade é que as coisas nunca voltarão a ser o que eram. Por vezes, fazes-me falta. Outras vezes, és indiferente. Na realidade, em certos momentos, deixo de estar certa de ter já aprendido a viver sem ti. É esta dualidade que me afecta todos os dias, este sentimento ambíguo que ainda nutro por ti. Mas acredito que já falta muito pouco mesmo para seguir o meu caminho completamente sozinha, sem a tua sombra atrás.

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Conversas

(…)
– Às vezes a vida desilude-nos.
– Muito mesmo. Mas distinguem-se aqueles que não se abatem com isso. Eu tenciono sempre fazer parte desses “valentes”.
– E há aqueles que desiludem os outros :S
– Também. Mas esses deixamo-los para trás, se não valerem a pena.
– Exacto. Mas tudo vai passando.
– O tempo é a melhor cura para tudo. Juntamente com uma grande dose de sanidade mental.
– Lá está. Mas ficam sempre cicatrizes. Até para os que desiludem.
– As cicatrizes são como as feridas: fecham, saram.
– Mas marcam. E algumas ficam para sempre.
– Pois ficam, mas há que fazer delas aprendizagens, dar-lhes um bom uso.
– Nem mais.
– Posso dizer que sou uma aprendiza nata e valente.
– Eu tento ser. Ainda ando a aprender.
– E tens muito caminho pela frente, muito para aprender. Mas é bom saber que já encontraste a direcção.
(…)

sábado, 5 de setembro de 2009

É bom saber


É bom saber que nem tudo mudou. É bom saber que te tornaste maduro. É bom saber que há laços que perduraram. É bom saber que estás consciente de tudo o que fizeste. É bom saber que, depois de tudo e acima de tudo, afinal (ainda) somos amigos.

Afinal de contas, para mim serás sempre o amigo .

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Vou ter saudades, muitas


Começo a sentir falta de tantas pequenas coisas, tem batido em mim uma tão grande nostalgia. As recordações são algo tão precioso em mim, tenho tantas saudades de tantos momentos. Estes últimos anos foram maravilhosos, passaram por mim pessoas boas e pessoas más, mas ficam todas guardadas comigo para sempre. Algumas já me habituei à sua ausência, outros sei que, pelo menos por agora, não suportaria perder. Vou para longe mas fica aqui um pedaço de mim com todas elas, agarrado a elas. E levo um pedaço delas comigo, para a sua presença mental ser constante, para me continuarem a apoiar e proteger como sempre fizeram. Tenho medo de ficar sem as pessoas que mais amo. Quero mantê-las sempre comigo, quero estar com elas sempre que possa. Por outro lado, sei que adaptar-me a um novo lugar, a novas pessoas, a novos ambientes, a novas situações me fará bem. Irei crescer dentro de todo o novo contexto, esperando ter sempre a meu lado, presencial ou psicologicamente, aqueles que fazem de mim uma pessoa feliz, aqueles que me dão razões para sorrir, aqueles de quem nunca me esquecerei. Sabem quem são. E sabem que me terão sempre. Obrigada por tudo o que tivemos até agora, prometo termos muito mais. Sempre.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Agora


Agora és tão importante como um simples conhecido. Obriguei-me a mim própria a passar-te para essa categoria, mas não te esqueças: tu passaste-me primeiro para igual categoria na tua vida. Lidar contigo, perceber-te, já foi para mim muito mais fácil do que agora é; de facto, posso dizer que já não te conheço, ou melhor, que já não és como te conheci. E tenho saudades da pessoa que eras. Notei quando te cansaste de tudo. Eu também estava cansada. E foi então que decidi que a servidão a ti iria acabar. Resolvi de uma vez por todas deixar de ser a gaja que te pertencia. Cansei de percorrer o caminho que me conduzia a ti, essa estrada que todos julgavam longa e que no entanto eu não me importava de percorrer. A campainha de tua casa ainda ressoa na minha cabeça e o som que a acompanha relembra-me quando me dizias para subir e me recebias calorosamente. Durante aquele período de tempo, tudo era perfeito, ou assim parecia ser. Não havia complicações e tu, assim como eu, gostávamos que assim fosse. Estava-se bem e pronto. Mas já perto do final, soube que não tínhamos futuro. Os últimos dois meses foram terríveis. A minha cabeça não tinha nada dentro, à excepção de ti. Era todo o tempo a pensar se era mesmo aquilo que eu queria, se valeria a pena continuar a ter-te numa completa vazão de sentimentos, se eu iria aguentar assim por muito mais tempo. Aqueles dois últimos meses foram surreais, nunca pensei vir a questionar tanto as coisas. E foi então que por imposição das coisas normais que a vida tem, tivemos que deixar de nos ver, isto precisamente na altura em que eu tencionava deixar-te. Foi doloroso, muito doloroso mesmo, porque apesar de todo o mal que me fazias, eu gostava demasiado de ti para te largar e não sentir dor por tal acontecimento. Tive que ir ao mais fundo de mim buscar forças que nem imaginava existirem, mas mesmo assim fui-me muito abaixo. Mas tudo fiz para não dar importância à nossa separação e seguir em frente. Foi um processo de habituação complicado e demorado, mas o que é certo é que hoje tenho a sensação de dever cumprido, sinto mesmo que já aceitei o que aconteceu. Compreender não, não compreendo, nem nunca hei-de compreender muitas das coisas que aconteceram, mas aceitei que tinha sido assim. Antigamente pensava que o tempo não era cura para nada, que as chamadas ‘borrachas temporais’ eram fruto de conselhos impossíveis de concretizar mas agora sei que o tempo tudo ajuda a curar, tudo ajuda a esquecer. O tempo faz com que deixemos o que era mais importante antes para segundo plano no agora. O tempo é um curioso mistério, porque tanto nos pode levar a deixar as coisas para trás como nos pode levar a reviver mentalmente tudo e fazer com que não nos esqueçamos o que queremos apenas e só esquecer. E de facto, nos meses posteriores à nossa separação eu tanto regredia por recordar e reavivar os nossos momentos, como prosseguia em frente, agarrando-me à vontade de te esquecer, à vontade de ultrapassar tudo. Ultrapassei, sinto que alcancei o meu objectivo de todos os dias, de todos os segundos destes últimos meses. Agora sou capaz de estar na tua companhia sem meter pelo meio os antigos (res)sentimentos, agora consigo estar bem na tua presença. Agora, queria que se abrisse espaço para de novo sermos bons amigos. Achas que pode ser?

sábado, 8 de agosto de 2009

3+3


Agora, ora agora é tempo de virar a enorme página que foram estes três anos de secundário, estes três anos em que sempre estiveste presente na minha cabeça, no meu dia-a-dia. Agora é tempo de agarrar estes três anos de universidade que se avizinham, estes três anos que serão dos melhores da minha vida, estes três anos em que a universidade simultaneamente me proporcionará cabeça ocupada com os estudos e cabeça ocupada com o divertimento inerente à vida académica. Será uma nova etapa, boa, espero.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A saudade não mata, mas mói


"I remember the days we spent together
were not enough
and it used to feel like dreamin'
except we always woke up
Never thought not having you
here now would hurt so much."


Tonight - Fm Static

sábado, 1 de agosto de 2009

Foi


[Voltei. Estive sem Internet durante uns dez dias, o que foi uma grande chatice.]


Foi apenas um momento de sobriedade esquecida, entre tantos outros amarrotados nas voltas que o tempo fez e refez. Foram palavras, partilhas, olhares. Foi um tudo cheio de nada. E acabou. Tão depressa que ainda nem o sinto. Tão depressa que ainda não me habituei à vazão que se apoderou de todo este corpo inabitado. Caímos no vazio sem fundo, atingi a sensação de ter existido e subitamente não mais existir. E agora nada mais resta senão recordações de tudo o que foi e já não é. Tudo o que eu pensava ser afinal não foi. Tudo erros, tudo ilusões completamente fictícias que habitaram na minha mente. Agora apenas vivo comigo. E tu ficaste no passado.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Até sempre


Partiste para sempre naquele dia esbranquiçado por milhares de flocos brancos caídos do céu. Tu ali, imóvel, impávida e serena como sempre te conhecera, ias enregelando, fruto da agreste brisa de ar frio que provinha da porta entreaberta e fruto do teu novo estado orgânico. As pessoas, minuciosas nos seus passinhos, calcorreavam a neve entretanto acumulada. Por entre saltinhos, procuravam chegar o mais depressa possível do carro a casa e da casa ao carro. Muitos, juntos em grupinhos dentro da sala e também da cozinha, comentavam a fantástica mulher que havias sido. É usual quando alguém morre dizerem-se as coisas mais bonitas sobre a pessoa em questão, mesmo tendo de se recorrer à invenção e mentira. Mas contigo não era preciso. Tinhas dado mais do que motivos a todos para falarem bem de ti. Tiveste sempre o afecto que todos procuram, a palavra mais que amiga, a sabedoria dos teus oitenta. Sorrias embevecida ao ver os teus netos correndo alegremente, era preciso tão pouco para te sentires feliz, sempre te admirei nisso. O teu sorriso e a tua voz estão para sempre guardados em nós. Hoje, passados nove meses desde que partiste ainda te sentimos feliz, ainda te sentimos entre nós, ainda te sentimos muito nossa. Até sempre, tia-avó.

sábado, 11 de julho de 2009

Faltas-me



Perguntaste:
- Hey, ‘tá tudo?
Apeteceu-me responder-te:
- Não, faltam-me pessoas.
(Para estar tudo e todos, faltas-me tu).

quarta-feira, 8 de julho de 2009

06 Março 2009











- Estou a entrar em parafuso
- Porquê?
- Acho que me sinto tipo sozinha
- Ui, como assim sozinha?
- Sinto a falta de todos
- Eh lá, já?
- Já porquê?
- Mas por saíres da escola?
- Por tudo
- Sensação estranha
- Muito, muito mesmo
- Mas não estás sozinha miúda
- Acabo por estar sim
- Mas não estás
- Isso é o que dizes
- Porquê?
- Porque eu sei o que sinto, e sei que é preciso as coisas estarem a acontecer na realidade para eu estar assim…
- E o que é que se tem passado para te sentires assim?
- […] Sinto a falta de estar com as pessoas presencialmente, pronto.
- Mas a tua vida vai mudar, os teus amigos vão mudar… Não penses que a tua vida vai ser sempre a mesma
- Eu sei, e é talvez a noção de que todas estas pessoas vão ficar para trás que me deixa este vazio
- Essas pessoas preenchem o teu passado… O teu futuro tem novas pessoas que te vão preencher
- E agora? Quem preenche? Ninguém.
- Agora preenche a família que está sempre… E eu também estou, mas no coração.

Antes estavas no coração sim, mas há muito tempo que te evadiste desse teu posto.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

God's mistakes












I'll spend hours in the mirror
Or as long as it takes
I'll spend hours in this mirror
Correcting God's mistakes
I think I'll find true love tonight
I can feel my heart pulsating
I think I'll find true love tonight
My soulmate is waiting
Just killing time before I die
As this dream of mine it shatters
I know it's sad but I wont cry
Cause nothing really matters

God's Mistakes by Fear Cult
.

sábado, 4 de julho de 2009

Fins


Quando as coisas têm um fim, já não se pode desistir. Elas desistiram primeiro do que nós, e acaba por ser difícil de aceitarmos que não fomos nós que lhe colocamos um término. O ser humano é um ser por norma orgulhoso e que gosta de deter o poder sobre tudo. E quando, subitamente, deixa de ser ele quem manda no que o rodeia, ainda por cima quando já tomou o gosto a essa sensação, sente-se impotente e incapaz, incapaz sobretudo de admitir o que lhe aconteceu. Mas é mesmo assim, na vida tudo tem um início e um fim, e nada é excepção à regra. Uma vez, já quis desistir. Mas tudo teve um fim antes de eu o fazer. E eu preferia ter simplesmente desistido.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Felicidade


A felicidade não é um dom, é uma conquista. Ninguém nasce com ela, temos de a conquistar, logo não há razão para esmorecer perante um obstáculo, há sim que meter na cabeça que a luta será constante até ao último dia. E perceber que nunca teremos a felicidade plena, isso é algo impossível de alcançar, porque por muito felizes que estejamos, isso nunca nos chegará. Enquanto lutamos pela felicidade, há que manter o sorriso aceso no rosto. Só assim é possível a chama do sonho nunca se apagar e nunca regredirmos na nossa luta.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Até já, estou no corredor.


Chegas a casa, cansado do trabalho, e nem te lembras de me dar um beijo. Dói. Atiras o casaco para o bengaleiro, mas ele vai parar ao chão e nem o apanhas. Caramba, estou farta de te dizer para não deixares nada desarrumado. Não me importa que não gostes desta minha mania das arrumações, mas padeço desta terrível extravagância. Vais tomar um banho, dizes, e arrastaste-te pelo corredor fora, esse espaço carregado de fotografias simbólicas, que se calhar só o são para mim. Vens para jantar, mas quando é que tencionas perceber que eu não sou a tua empregada e sim a tua mulher. Abraça-me pelo menos, tenho tantas saudades de te sentir a enlaçar-me em ti. Mas já não sabes o que é isso. Sabes que mais? Estou farta, querido, hoje não janto, digo eu e tu dizes Está bem. Podias ao menos perguntar porquê. Mas a tua preocupação comigo já se esgotou há muito. Estás aqui e é como se não estivesses, entendes? Não, não entendes coisa nenhuma do que digo ou penso, e não fazes sequer um esforço para tentar. Já não aguento mais, vou chorar para o corredor, não me apetece olhar para a tua cara, é dia após dia isto e eu não fui feita para viver assim. Acorda desse mundo que é só teu e em que não me deixas penetrar. Eu queria somente ter-te no verdadeiro sentido da palavra, mas o que tenho resume-se a um marido que chega do trabalho, come e vai dormir. Porque se acabaram os tempos em que ficávamos juntos no nosso sofá, bem aconchegados a ver um bom filme. Antes sabias escolher bons filmes, agora nem sequer sabes ver um filme. Vê se percebes que preciso de mais do que um homem cá em casa, preciso de um marido, isso sim. Só te peço que retornem os antigos momentos de partilha a dois, que voltemos ao que éramos no nosso primeiro ano de casamento, porque agora já sem sequer chamo a isto um casamento. Até já, meu amor, vou percorrer cada fotografia de felicidade espelhada que se encontra no nosso corredor, esse álbum de memórias que começa a ser mais meu do que teu.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Amanhã vamos ser felizes?


Amanhã vamos ser felizes? Dá-me a certeza de que sim, de que vamos calcorrear a calçada da rua ali de fora de mãos dadas, esboçando largos sorrisos e fazendo promessas infundadas de eterno amor. Dá-me esse prazer momentâneo, essa sensação de que te terei comigo para sempre, apesar de saber que só existes no presente e que depois serás mera recordação, entre tantos outros, ainda que sobressaias. É sempre assim, eu não consigo conservar aquilo de que gosto e mais tarde ou mais cedo vais-te cansar desta bipolaridade que me afecta a cada minuto que estou contigo. Conheces bem este querer-te desmedido. Mas amanhã, meu amor, vamos ser felizes, eu sei que sim, porque amanha vou acordar bem-disposta, eu sei que sim, sei. E vou beijar-te como se se tratasse novamente da primeira vez que os nossos lábios se tocam nessa união selada que tão bem sabe. Encontramo-nos nesse silêncio sagrado, o olhar por vezes consegue falar mais do que um grande conjunto de palavras. Apesar desse brilho que mostras, eu sei que os teus olhos me mentem, eu sei que eu sou apenas mais um passatempo que consomes até não poderes mais. Enquanto isso, vais procurando o próximo passatempo. Quando o encontrares avisa, sim? No fundo, já deves ter decerto encontrado. Essa outra sem cara nem nome já te preenche as horas vagas, eu sei, e no entanto, ando aqui a fazer figura de ursa a lutar por algo que já não é meu. Os teus olhos mentem, por isso porque tentas-me prender a ti? Eu prendo-me, não te dês ao trabalho, a sério. Mas, oh, amanhã vamos ser felizes, tu vais-me trazer de novo a casa, vais-te sentar ali na escadinha junto a mim. Os vizinhos invejarão o que (agora) temos, serão testemunhas de tudo o que partilhámos. E quando tiveres de ir vais-me abraçar bem, enrolar-me confortavelmente em ti e olvidar tudo o mais que existe no mundo. Mas um dia não vais mais vir por essa rua acima. Nesse dia, digo-te Adeus, está bem? Mas amanhã, amanhã vamos é ser muito felizes.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Seremos nada





Escrito em 03-01-2009





Não aceito que cheguemos a esta condição: a quase obrigação de dizer “Olá”, os olhares secos e sem expressão de nada, o evitar passar um pelo outro. Subitamente, tantas palavras doces, tantos sonhos alimentados, tantos momentos partilhados começam a transformar-se em meras memórias que habitam cada vez mais desgastadas nas nossas cabeças. Antes dizias que eu era muito, que tudo o que partilhávamos seria para sempre. Eu não acreditava que fosse para sempre, mas acreditava que na tua vida significava muito, e isso bastou-me para crer que os nossos sentimentos tinham bases sólidas, tinham espaço para crescer. E não é mais assim. Tudo desvairou, começamos um progressivo afastamento e nunca mais iremos voltar ao que fomos. Que é feito de tudo? Não nos restam muitas esperanças, não há forma de crer num futuro que certamente não será escrito em conjunto. Fomos muito, somos algo, seremos nada.

[E não é que naquela altura previ o futuro?]

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Voltaste (e eu não quero que voltes)


Tens sempre de voltar para me atormentar, não é? Afinal já faz parte de ti, não te cabe na cabeça que eu consiga ser feliz sem ti, que eu consiga ter uma vida normal apesar de não te ter. Mas eu consigo e isso faz-te confusão, então tiveste que voltar. Tiveste de remexer no passado que eu tinha fechado com pesada chave de estanho. Feita de tão frágil material, ontem partiu-se, ou melhor, tu quebraste-a e reviraste tudo o que encontraste. Puseste-me sem conseguir dormir, puseste-me a tentar de novo convencer-me de que te odeio. Andei todo este tempo a crer que nunca mais ia falar contigo, que não te responderia a nada, e no momento em que deveria ter aplicado esses pensamentos, fraquejei como sempre faço perante ti. Tomámos a já habitual conversa de circunstância que cada vez mais detesto. Sentiste-me fria contigo, e ainda bem. É necessário que percebas que já deixei de estar aqui para te dar afecto quando precisas. Ontem apeteceu-me tanto dizer-te tudo o que já há algum tempo precisas de ouvir, mas não fui capaz. Nunca sou. Agora quero convencer-me de que, se houver próxima, eu irei conseguir. Ou não. Mas agora deixa-me viver apenas por mim, de uma vez por todas.

Gravity




Gravity by Sara Bareilles -

Existem letras de músicas que por vezes conseguem descrever o que sentimos melhor do que nós próprios conseguimos descrever .
E esta faz isso na perfeição .





Something always brings me back to you. It never takes too long.
No matter what I say or do I'll still feel you here 'til the moment I'm gone.
You hold me without touch. You keep me without chains.
I never wanted anything so much than to drown in your love and not feel your rain.

Set me free, leave me be.
I don't want to fall another moment into your gravity.
Here I am and I stand so tall, just the way I'm supposed to be.
But you're on to me and all over me.

You loved me 'cause I'm fragile. When I thought that I was strong.
But you touch me for a little while and all my fragile strength is gone.

Set me free, leave me be.
I don't want to fall another moment into your gravity.
Here I am and I stand so tall, just the way I'm supposed to be.
But you're on to me and all over me.

I live here on my knees as I try to make you see that you're
everything I think I need here on the ground.
But you're neither friend nor foe though I can't seem to let you go.
The one thing that I still know is that you're keeping me down.
You’re on to me, you’re on to me and all over...
Something always brings me back to you. It never takes too long.

sábado, 6 de junho de 2009

Farta , farta , farta


Estou farta que sejas tu e tu e tu , e ainda tu ,
apenas tu na minha cabeça!

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Não sei ser


Tudo me lembra de ti. Tudo mesmo. Porque é que não sou capaz de fazer a distinção entre o que ainda compõe a minha vida e o que já a compôs? Cada ínfimo detalhe, cada indeterminante pormenor, em cada coisa estás sempre. A minha cabeça é assaltada todo o tempo por flashbacks, revejo cada momento que passamos, cada conversa que tivemos, cada segredo que te contei. Imagino cada um dos momentos que podíamos ter vindo a ter. Eu já não sou nada senão um enorme conjunto de recordações e perguntas sem respostas, e assim não sei ser.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Piano (mais uma vez)


As luzes irão iluminar a minha peça interpretada sobejamente nestas teclas já gastas. Toco neste meu piano imaginário com a força de quem toca num verdadeiro. Nunca soube tocar piano, mas faz-me bem imaginar que o estou a fazer, sentir as notas a percorrerem avidamente os meus dedos, buscando a tecla, buscando a voracidade da música a percorrer me tal qual o sangue nas veias. Fecho os olhos e imagino. A imaginação é capaz de nos levar onde quisermos e a mim leva-me a um banco de veludo em frente a um piano de cauda, onde me sento e preparo para tocar aquela que será sempre a melhor de todas as melodias. Sinto a música, ela acalma-me mas põe-me também selvagem. Ela tira de mim as forças e simultaneamente restitui-mas. Envolvo-me na melodia, a minha cabeça lateja de vontade de calcorrear com as minhas mãos cada pedaço de branco e preto do contraste que este teclado possui, as notas já se entrosaram nos meus sentidos. O piano acalma-me, estas teclas são o meu ponto de refúgio e, no entanto, são apenas imaginárias.

domingo, 31 de maio de 2009

Noventa e quatro dias


Já se passaram noventa e quatro dias e no entanto parece que tudo já se passou há anos. Ainda assim, continuo a sentir a tua falta exactamente como sentia no primeiro dia, nada melhorou como disseram que ia melhorar e o sentimento de perda adensa-se a cada dia que passa. Perdemos muito em vários aspectos e não há retorno a dar. Só sei que preciso de ti. Por mais que procure sobrepor o sorriso à recordação que se esbate em mim, é demasiado irreal fingir que sou feliz sem ti por perto. A minha cabeça amotina cada pequeno detalhe e não chega a lugar nenhum. Juro-te, só precisava que continuasses a ser o melhor amigo '$

Queres tirar mais alguma coisa de mim?


Num tempo denominado antigamente, eu sempre encontrava as palavras certas para descrever a forma como me encontrava e o que sentia em relação a tudo. Mas num tempo que chamam de presente ou agora, mas que eu sinto parado, tendo a não conseguir dizer o que preciso de dizer. A minha cabeça fervilha de ideias, mas quando pego na caneta e procuro expor tudo aquilo a que me proponho no papel, a imaginação vai-se, a inspiração esfuma-se e eu fico com dois utensílios de escrita na mão sem saber o que lhes fazer. Nesses momentos sinto-me ridícula, afinal tudo o que tem sucedido só me daria mais razões para realizar a minha já habitual catarse emocional, mas fico incapacitada, olhando hirta para as linhas vazias e procurando um novo fio condutor para as minhas ideias. As minhas palavras são hoje, para mim, algo de difícil alcance.
Já não sei escrever como antigamente, até isso me fizeste perder, obrigadinha.

sábado, 23 de maio de 2009

Renovação


Eu queria entender tudo, eu queria ter esse poder que toda a humanidade almeja. Eu queria poder perceber o que se passou no passado, queria poder saber o que se vai passar no futuro e acima de tudo queria compreender o presente. Eu queria muitas coisas, e tenho poucas. Saberia eu lidar com tudo? Não sei agora, não consigo lidar de forma alguma com nada do que se passa a meu redor. A necessidade de acreditar e de ser forte costuma prevalecer em mim, mas por vezes torna-se difícil. Quase impossível até. Eu sei que a vida é um sistema de aprendizagens contínuas, eu sei que seremos sempre meros errantes a desempenhar papéis trocados, eu sei que nunca nada será como queremos, mas eu peço sempre mais, eu preciso sempre de mais. Eu preciso de encontrar tudo o que não tenho e depois perder. Mas quando perco fica o vazio, nada me preenche, sorrio mas por dentro o sentimento existente não proporciona sorrisos verdadeiros. Que eu sorrisse sempre e verdadeiramente, não seria pedir muito. Que os papéis não se trocassem, que o tempo não apagasse nada, que cada sentimento e história se preservassem no decorrer da minha vida, não queria muito mais. Preciso de sorrir verdadeiramente a tempo inteiro, mas não sou capaz. Preciso de me renovar. A questão é: como faço isso?

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Catarse



O texto que se segue é a minha tentativa de catarse emocional, é o descarregar de muitas emoções contidas dentro de mim, é a descrição de tudo o que sucedeu no antes e depois do falecimento da Amélia. É um testemunho extenso e muito pessoal.


Quando faleceste eu julguei que iria escrever sobre isso, a toda a hora me vinham frases e palavras à cabeça para descrever o que eu estava a sentir e o que todos os outros sentiam também. Mas o que é facto é que na altura não tive a coragem necessária para dar asas à minha alma e fazer-te o que eu posso apelidar de homenagem escrita. Volvidas duas semanas e meia, encontro-me a tentar transpor para o papel o que senti, as tormentas que me assaltaram, as lágrimas que rolaram em mim e nos outros, sentimentos desconexos, caras taciturnas à minha volta, a incompreensão espelhada nas faces, conversas que tive com os mais importantes da tua vida. Sabes, é estranho estar a escrever-te quando já não estás entre nós, é estranho dirigir-te um escrito, é estranho falar-te ao coração como se ele ainda batesse. Mas não encontro outra forma de escrever tudo o que preciso, e acima de tudo, o que conseguir escrever, já que tenho a certeza de que muito ficará por te dizer. Os dias que antecederam a tua morte (estranho como agora uso a palavra com relativa normalidade), foram surreais. Uma semana antes, quando te visitei nos cuidados intensivos eu tive a certeza de que ficarias curada, de que mesmo não voltando a usufruir de uma vida normal irias voltar a sorrir entre nós. Olhei para ti, e apesar de alterada pelo coma, eu via-te quase como antes do acidente. Eu sei que era um pouco obra da minha cabeça, eu não queria aceitar que estavas da forma que estavas, foi-me mais fácil refugiar na imagem que sempre tive de ti. Recordo-me perfeitamente da angústia que se apoderou de mim antes de entrar no bloco onde estavas, afinal as descrições que todos tinham feito davam conta que estavas bastante modificada pelo acidente e pelo coma, o que era bastante verdade, e eu não sabia como te ia encontrar. Ao percorrer aqueles corredores brancos e vazios junto com o teu filho, eu pensava no que iria conseguir dizer, se me conseguiria conter diante dele e na forma como ele iria reagir. Quando chegámos à tua cama, ele agarrou a tua mão com força e confesso que nesse momento quase chorei, mas procurei manter-me forte, e consegui. Conversei com ele distraindo-o do contexto em que estávamos, e quando ele me disse assertivamente que irias estar acordada para lhe dar os parabéns no dia de aniversário dele, eu acreditei com ele, eu pensei que sim, que irias conseguir. Durante as duas semanas de internamento, não foi fácil, o aniversário do teu filho estava a chegar, a tua filha acreditava que ia falar contigo no Dia da Mãe. E eu caí também na teia de ingenuidade deles, mas afinal todos precisávamos de acreditar fortemente que ias ficar bem. Quando eles jantavam todos cá em casa, as lágrimas começavam sempre a rolar-lhes pela cara, eu nem sempre me consegui conter, mas sei que fui exímia no apoio que sempre lhes prestei. A tua filha encontrou mais do que nunca uma amiga em mim, e encontrará sempre. Os olhares de agradecimento que o teu marido me fazia ao reconfortar os vossos filhos valiam milhões, de facto, nessa altura senti-me tão, mas tão útil. Passada então uma semana de ter estado no hospital, no dia do aniversário do teu filho, ao ouvir uma conversa apercebi-me de que falavam que a operação não te tinha feito ficar melhor e que já só te restavam poucas horas. O meu coração deve ter parado, era como se aquilo não pudesse acontecer, ainda hoje eu não sei aceitar isso, nem me convencer de que já te foste para sempre. Pensei na dor dos teus filhos, eu precisava estar com eles, mas eles estavam longe, eu ia ter que esperar. Foi um dia estranho para mim, era como se tal fosse impossível acontecer, simplesmente não fazia qualquer sentido. Era sexta-feira. No sábado, os meus pais, também no seu sofrimento pela amiga que se ia, pelo amigo que ficava cá sozinho com os três filhos, disseram-me que por causa da autópsia o funeral só ia ser na segunda ao final da tarde. Eu pensei que era demasiado tempo de espera para todos, só ia aumentar o sofrimento daqueles que gostavam de ti. Mas não havia nada a fazer. Eu só pensava como é que os teus filhos e marido estariam. Até que chegou domingo. Pela primeira vez desde a tua morte, vi os teus filhos. Sabes, com o mais velho nunca tive grande confiança, mas estava solidária com ele também. O do meio, eu não sabia como chegar a ele. Ele fechou-se numa concha e não deixava as mágoas saírem cá para fora, procurava aparentar uma força interior que já não possuía. Senti-o desamparado e apoiei-o da forma que pude. Mas com a mais nova, a tua filha, quando cheguei ao quarto onde ela estava, não aguentei mais. A forma como ela chorava e expressava a injustiça de que se sentia alvo fizeram-me revelar a minha fraqueza. Mas fui buscar todas as minhas forças e abracei-a com força, acho que nunca tinha empreendido tanta força num abraço. Sei que ela se sentiu mais amparada e isso reconfortou-me. Sei que ela encontrou em mim a escapatória para todas as pessoas que lá vinham dizer os malditos pêsames e dizer que percebiam o que ela estava a passar. Não, ninguém percebia, nem mesmo eu. E os pêsames para ela eram terríveis, mas ninguém compreendia que isso é do pior que se pode dizer naquela situação. Saímos daquela casa e viemos passear. Nesse momento senti-me ainda mais útil, relembro a forma como rimos juntas, as conversas banais que conseguimos ter apesar de tudo o que se passava ali perto. Eu sei que foi bom para ela. E, graças a deus, todos perceberam isso mesmo e sugeriram que ela dormisse em minha casa. Eu recordo-me de pensar como iria ser, se ainda tinha estofo para a fazer esquecer tudo o que se estava a passar por muito mais tempo. E consegui, deu-me muita satisfação fazê-la sentir-se feliz por instantes. Naquele conjunto de dias, eu aprendi o quanto era bom sentirmo-nos úteis, fazermos bem a alguém. Sabes, eu olhava para ela sentada na minha secretária, rindo comigo e fazendo todas as coisas que sempre fazia quando cá vinha, e pensava que aquela não era a rapariga a quem tinha acabado de morrer a mãe. Senti-me feliz por estar a fazer alguém feliz. Dormimos, no dia seguinte ao acordarmos custou-me imenso ter de abandoná-la durante a manhã, mas lá teve que ser. Confesso que durante a manhã consegui estar bem, alhear-me também eu do que se estava a passar. Depois chegou a tarde, a hora do funeral aproximava-se e eu sabia que cada vez ia ser mais complicado. Enquanto não vieste, a tua filha esteve comigo, ora animada, ora a chorar no meu ombro. Recordo também o gesto que tive com o teu filho, naquele momento senti que ele era ainda mais frágil do que aparentava e que precisava também do meu apoio. Quando chegou a carrinha funerária ao sítio onde a esperávamos, e partimos atrás dela, nunca mais nenhum de nós se conteve. Ir no carro só com os teus filhos e marido custou-me imenso, eles choravam uns pelos outros, eu já não sabia que mais dizer para os reconfortar, eu já não controlava também o meu choro, eu já não me sentia suficiente para apoiar a tua família, mas fiz tudo o que pude. Chegados à igreja, com duas horas de atraso graças à autópsia, tive de os abandonar. Todos respeitamos a vontade do teu marido e filhos, de ficarem algum tempo sozinhos contigo dentro da igreja e de te verem, apesar do estado de decomposição que já deverias aparentar. Lá dentro, só ficaram vocês e o meu pai. O teu marido pediu que ele ficasse, para lhe dar apoio. Recordo-me de nesse momento ter sentido que o meu pai de facto era um pilar importante para o teu marido. A minha mãe e a vossa melhor amiga aguardavam na sacristia e eu chorava à porta, nos ombros que minhas amigas e amigas da tua filha me ofereceram. Elas foram importantes. A minha dor era complicada de descrever. Eu sofria pela amiga mais velha que representavas para mim, pela amiga de família que nos eras, pelos teus filhos, pelo teu marido, pela minha mãe de quem eras a melhor amiga, pelo meu pai de quem o teu marido é o melhor amigo. Sofria por multiplicadas razões e o funeral foi muito complicado para mim. Depois no teu enterro tudo o que aconteceu foi surreal, não há descrição possível. Quando de novo consegui chegar junto dos teus filhos, estes tinham tomado calmantes e foi um regozijo ver que estavam calmos e mais sorridentes, apesar do que se tinha acabado de passar. Naquela altura, abençoei o facto de existirem remédios tão preciosos. A noite caía, tivemos de vir para casa, mais uma vez foi muito difícil. Os dias seguintes têm-se passado entre tentativas de animar a tua família, de os fazer regressar à vida que tinham. Acredita que todo o apoio necessário lhes está a ser concedido por nós. Na tua falta, cuidaremos deles.

Desculpa escrever-te desta forma tão pessoal, mas foi a forma que encontrei para mais uma vez tentar aceitar o que sucedeu.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Cartas


Eu não escrevo cartas, mas se calhar era-me mais fácil escrevê-las e enviar-tas ao invés de escrever e pensar coisas que nunca serei capaz de te dizer cara a cara. De facto, em vários aspectos consigo ter muito pouca audácia. Tenho vindo a ganhar bastante noção de que ficou muito por te dizer, e afinal de contas vai continuar por dizer. Eu queria que tudo tivesse terminado de forma diferente. Sempre te pedi muito pouco, estou farta de referir isto, as minhas palavras já se repetem sucessivas e sucessivas vezes. Mas é a verdade, eu pedi-te muito pouco, apesar de todo o amor que sempre nutri por ti, nunca te exigi o mesmo da tua parte. Nunca. Apenas te pedi, várias vezes, que a nossa amizade nunca terminasse, que fôssemos os melhores amigos, como aconteceu durante os nossos meses, sim, nossos. Sempre me afirmaste que esse sentimento de amizade iria permanecer para sempre, que velhos iríamos estar juntos a rir, sempre como amigos. O meu pensamento nunca voou tão longe assim, afinal de contas para “velhos” ainda é muito tempo, mas imaginava a nossa amizade a perdurar mais uns aninhos. Durante todo o tempo em que foste o meu melhor amigo, eu procurei adormecer o amor que sentia por ti. De certa forma foi uma tentativa falhada, ou talvez não. Quando eu estava contigo, ainda que fosse pelo que era, tu eras um amigo, eu não podia deixar que amores se intrometessem no nosso caminho, isso sempre acaba por estragar tudo. Por isso, deixei de lado essa minha vertente amorosa, sempre procurei manter acesa apenas a chama da amizade, sempre procurei cultivar a amizade, só e só a amizade, e tu sabes bem disso. Mas nem tudo tem um final feliz. Eu não sei quem errou, eu não sei sequer se alguém errou, o que é certo é que não houve um final feliz, nem sequer um final infeliz. Simplesmente, de certa forma, não aconteceu um final. As coisas estagnaram. De um momento para outro, não houve mais nenhuma palavra, mais nenhum sorriso, mais nenhum toque, mais nenhum encontro, mais nenhuma conversa, mais nenhuma amizade. Nem sequer posso dizer que estejamos zangados, isso irrita-me, mas nós nunca nos zangamos por acontecimento algum. Apenas deixamos de falar, queira isso dizer o que quer que seja. Até hoje, permaneço sem compreender. Não há nada em que eu gaste mais tempo a pensar, a minha cabeça permanece absorta a engendrar que raio aconteceu, que raio se passa connosco, a tentar perceber o porquê de termos deixado de ser amigos. Caramba, eu sempre disse “não, ele não há-de ser um bom tipo pa namorar, eu gosto dele, mas não o quero para namorado. Mas amigo, amigo sim, ele é das melhores pessoas que já conheci, eu quero-o como meu melhor amigo, apenas”. Repeti tantas e tantas vezes esta ladainha, eu sabia que era isto o que a minha cabeça e o meu coração ditavam, eu nunca tive quaisquer duvidas, por isso não duvides tu disto. Sabes, não pedi quase nada mesmo, em comparação a tudo o que me poderias dar. Tu, a pouco e pouco, foste-me pedindo muito, sim, pediste. E recordo-me plenamente de me dizeres “agarra-me para sempre porque não te quero perder”. Para mim o “para sempre” seria impossível talvez, mas fiz questão de te agarrar, fiz questão de que não me perdesses. Mas afinal eu não valia assim tanto para ti, não significava tanto assim. Não tiveste problemas em me perder. Arranjaste rapidamente forma de me substituir, mas eu nunca fui capaz de te substituir, mas afinal de contas os significados são diferentes. Mas para mim os amigos não se substituem, se eles saem da minha vida é por iniciativa própria. Tu saíste por tua própria iniciativa, magoaste-me demasiado. Nunca serás capaz de imaginar o quanto, deixaste uma dor tão dilacerante, é demasiado irreal. Na minha cabeça, nunca seria concebível eu vir a sofrer tanto por um homem, mas o que se passa é isso mesmo, eu sofro por um homem. Às vezes quanto mais fortes somos, mais fracos nos apresentamos quando necessitamos de ter toda a força. Se calhar, gastámo-la em situações em que não seria tão necessária, procuramos mostrá-la em todas as situações e o que acontece é que a nossa força é uma energia esgotável. E a minha força para lidar com tudo o que se cinge a ti esgotou-se, eu já não sei ser forte como era usual ser. Tiraste-me as forças ou fui eu que tive que as empreender no total enquanto estive contigo, para não me deixar ir abaixo? Ver-te agora com essa tipa é estranho, eu vejo-te a fazeres com ela o que fizeste comigo, eu vejo-a no meu lugar, eu vejo-a a tomar para ela o que é (ou foi) meu. Engraçado porque enquanto eras meu amigo para mim tornava-se quase aceitável teres outras, eu sabia que não eras meu, mas sabia que eras meu amigo e isso bastava-me. Podias estar com trinta que isso não iria mudar nada (ou quase nada), claro que me fazia confusão, mas lá está, eu tinha a tua amizade (ou assim achava) e isso bastava para me preencher. E afinal de contas eu fui compactuando com o facto de dares atenção a outras, até de te envolveres com outras. Tu eras apenas meu amigo e como tal eu não te exigia seres exclusividade minha. Claro que a forma como nos envolvemos ia para além da amizade, mas mesmo assim não me dava direitos sobre coisa nenhuma, e eu respeitava isso. Durante aqueles meses suspeitei de muita coisa, durante aqueles meses tive quase a certeza que nuns dias estavas comigo, noutros estavas com uma das outras, mas nós só nos envolvíamos na busca de um relacionamento quase físico, eu sei que não eram laços de amor que ali existiam. Mas volto a dizer, eras o meu melhor amigo e isso bastava-me. Mas agora, agora eu já não tenho de suprimir o amor que tenho por ti, já que a amizade já não existe, logo já não tem que ser preservada. E o amor voltou em toda a sua força à superfície, e ao contrário do que eu esperava que acontecesse após o nosso afastamento, ele não se está a esvair, está sim a aumentar. Não sei se alguma vez te disse, mas sempre tive dificuldade em aplicar termos como um ‘amo-te’, ‘amor’, etc. Isto com os que te precederam. Mas contigo nunca tive qualquer receio de os dizer, eu sabia que era isso mesmo que eu sentia, eu sei que te amo, e sou capaz de o afirmar sem pesos na consciência, ao contrário do que fiz com outros antes de ti. Eu não brinco com os sentimentos, eu sempre precisei de aplicar alguma racionalidade nos meus laços afectivos, e contigo perdi alguma dessa racionalidade. Quando entraste na minha vida, de certa forma mudei. Ganhei alguns aspectos positivos, e outros negativos, claro. Com o tempo aprendi a viver com a forma como hoje sou, e em parte tu ajudaste. Trouxeste muito à minha vida, e quando te foste levaste grande parte dela. Sempre representaste um papel importante em tudo o que me envolve, sempre foi tudo feito a pensar em ti, em todos os momentos estavas dentro da minha cabeça, do meu coração, em mim. E agora estás a conseguir destruir-me, eu não consigo dormir, eu não consigo estar concentrada a trabalhar, eu não consigo estar com as minhas amigas sem ficar melancólica pelo que nos aconteceu, eu não consigo sequer escrever como antigamente. As palavras faltam-me, a inspiração foi-se, as frases mais que arquitectadas não surgem. Destruíste a pessoa quase fantástica que eu era, levaste a minha felicidade constante. Antigamente, eu só não ria quando estava a dormir, agora só rio em escassos momentos. Estou demasiado taciturna, duvido de tudo à minha volta, questiono todas as minhas outras amizades, deixei de ser a pessoa alegre que era. Sim, destruíste-me mais do que alguma vez eu pensei alguém vir a fazer, nunca pensei deixar-me levar assim. Não encontro pontos semelhantes entre o agora e o antes. Mudaste imenso, nunca pensei que fosses uma pessoa assim, eu confiava em ti, eu confiava naquilo que eras, naquilo que representavas, eu defendia-te perante tudo e todos. Agora não sei mais a pessoa que és, não encontro paralelismos entre o amigo que conheci e o desconhecido que agora estranho. E pior do que tudo, não me reconheço a mim própria. Só te queria de novo como meu melhor amigo, nada mais.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Gelo


Não imaginas a quantidade de pensamentos desconexos e adversos que se passaram na minha cabeça durante aqueles minutos semelhantes a eternidades. Duas faces do mesmo sentimento, se é que assim é correcto dizer. Queria estar ali e queria fugir de lá. Queria que estivesses lá connosco e queria que te fosses embora rapidamente. Queria sentar me ao teu lado e queria permanecer afastada. Queria falar contigo e queria desprezar a tua conversa. Queria olhar te nos olhos e queria fugir do teu olhar. Queria sentir a tua pele de novo e queria nem sequer sentir o teu perfume por perto. Queria poder dizer te tanta coisa e queria nem te dirigir sequer a palavra. Queria estar ali sozinha contigo e queria uma multidão à nossa volta. Queria que tudo fosse diferente do que foi. Mas acima de tudo, confirmei que estar na tua presença me faz agora imensa confusão.
Só as minhas duas parolas do coração puderam sentir o gelo que se instalou entre mim e ti. Satisfez dúvidas?

Inexplicável


Sabes, sinto que ainda tenho muito mais para te dizer, mas não consigo encontrar as palavras precisas para descrever o turbilhão de emoções que vai dentro de mim, nem a audácia necessária para expressar tudo o que merecias ouvir e apreender. Não há forma de explicar o quanto me desiludes a cada dia que passa. Sei que cada vez mais preciso de te esquecer definitivamente, de te odiar até. Sinceramente não vejo outra forma de deixar de te amar, se bem que actualmente já te odeio e amo simultaneamente. Existem coisas difíceis de se explicar.E ver-te ali, não sozinho, sorrindo como sorrias para mim destruiu-me ainda mais. Causaste danos durante todo o tempo e ainda continuas a causar.
Às vezes preferia ser menos eu. Preferia ser menos complicada. Preferia nunca te ter tido.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Não vou a lado algum


Eu precisava de te conseguir dizer que já te esqueci, que já não te amo. Mas não consigo mentir. Tudo está ainda aceso em mim. Por mais que procure sobrepor o sorriso à recordação que se esbate em mim, é demasiado irreal fingir que sou feliz sem ti por perto. Há páginas e páginas de quimera escritas por ambos, e (in)felizmente não terminaram. Gostava de poder afirmar que terminaram sim, afirmar tudo assertivamente, mas não posso. Ficou muito por dizer, acima de tudo ficou muito por sentir. Queria poder dizer palavras bonitas sobre nós, mas já nada pode descrever de forma bela o que somos. Porque nós somos nada. De tudo passamos a coisa nenhuma. Persistem coisas em mim que não sou capaz de entender. A minha cabeça amotina cada pequeno detalhe e não chega a conclusão alguma. Juro-te, só queria perceber tudo, perceber porque nos deixamos de falar subitamente, perceber porque deixamos uma amizade que eu julgava grande terminar abruptamente, perceber em que erramos. Só queria poder voltar atrás e corrigir o que de mal houve. Eu preciso de ti, não te pedia tanto como o que tivemos, só precisava da amizade. De saber que eras incondicionalmente o meu melhor amigo, não necessitava de tudo o resto. Fazes demasiada falta, volta de novo para mim.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Últimas horas


Restam algumas horas apenas. Sempre detestei esperar, mas para te ver sorrir de novo entre nós esperava o tempo que fosse preciso. As últimas horas, ainda por cima quando já sabemos o que vai suceder são as mais difíceis, reterei isso para sempre. Estupidez de vida!

Já sentimos a tua falta :$

quinta-feira, 30 de abril de 2009

Preciso de ti


Sinto saudades tuas. Faz-me confusão passar por ti e tanto eu como tu virarmos a cara. Nao somos capazes de nos enfrentarmos, agora somos estranhos conhecidos. Ou nem isso. Ambos somos teimosos, mais do que teimosos. Tudo podia ser mais fácil, mas este nosso maldito orgulho não deixa que nos entendamos para além de tudo o que sucedeu. Hoje queria ver o teu sorriso para mim, hoje queria ouvir uma palavra tua, hoje queria sentir um abraço teu. Não era preciso mais nada, só isso. Sinto mesmo saudades tuas.

Apesar de ser impelida por mim própria a não alimentar nada que me prenda ainda mais a ti, preciso tanto tanto tanto de ti.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Tempo e Sentimentos


Depois de tanto tempo volvido, ainda persistes. Não sei dizer porque é que continuas a permanecer em mim, se o que mais quero é que tal deixe de acontecer. Os sentimentos são algo obscuro, que poucas vezes se deixam compreender. São um campo minado assinalado num tempo indeterminado e sem lugar, e albergam trechos de vivências, colectâneas de amores e desamores. Poucas vezes se deixam mostrar na íntegra, há sempre recantos escondidos por entre becos recônditos da alma. Entregam-se ao vento, e andam por aí à solta, sem dó nem piedade do que encontram pela frente. Persegui-los? Impossível. Acatá-los? Talvez. Dominá-los? Nunca. Seremos sempre remetidos para a insipiência enquanto estivermos sob o seu domínio. Eles vão-nos dominando pouco a pouco, agarram-nos nas suas mãos, sem pensar no que nos vai acontecer. De início, é usual levitarmos pendurados nas suas asas. Depois chega o tempo em que é hora de cairmos no chão, ficarmos ali revolvidos. Chega a hora em que o bom acabou. Choramos esses tempos, tentamos que o tempo apague tudo da nossa memória. Mas o tempo não apaga nada, tudo fica, ainda que bem oculto. E tu não estás nem apagado nem oculto. Ainda. ‘$

Uma pergunta apenas


Afinal , em que é que erramos? '$

terça-feira, 28 de abril de 2009

Dualidade sentimental

Detesto-te e amo-te. Detesto-te por aquilo em que te tornaste, pela pessoa que eras ter desaparecido, pelos sentimentos se terem modificado. Detesto-te por já não seres o melhor amigo e teres passado à categoria de conhecido. Quero-te detestar ainda mais, mas não consigo, porque acima de tudo ainda te amo. Ainda persistes demasiado no meu coração, ainda sinto tanto, mas tanto mesmo a tua falta. Todas as noites experimento a tua ausência e o nosso fim. Todos os dias procuro encontrar razões para tudo ter tido terminado, para termos prosseguido em caminhos divergentes. Procuro perceber porque é que não nos resignámos à amizade que sempre afirmámos que iria ficar, porque é que nada ficou retido no ‘para sempre’. Hoje ainda lamento não ter cultivado tudo de modo a permaneceres, ainda lamento que nunca tenhas percebido a imensidão do que sinto por ti, de nunca teres encarado tal facto a sério. Queria perceber tudo, queria que desses um fim oficial em tudo, porque eu não sou capaz. Eu só precisava que me dissesses isso, eu não insistiria mais em querer salvar tudo, eu tenho a certeza de que iria finalmente esquecer-te. Ou quem sabe não, eu já tentei tanto fazer isso e não consigo, eu não consigo apagar-te de mim, estás gravado em mim em cada momento que eu vivo. Eu sinto demasiado a tua falta, eu não quero viver assim, sabendo que não posso procurar o teu aconchego. Eu procuro explicar para mim própria que tudo acabou, que já não há volta a dar, mas assim não dá. Eu preciso que me digas, eu preciso ter essa certeza, eu preciso perceber que tudo acabou definitivamente. Eu não fui feita para sofrer por amor, eu não aprendi nunca a ser assim e viver assim. Eu estou num enorme estado de lassidão e não sei como sair dele. Eu não consigo, mas preciso viver apenas por mim.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Piano

Hoje estive naquele nosso sítio. Cheguei, senti um arrepio percorrer indecorosamente o meu corpo acima e atravessaram-me mil flashes do muito que ali passamos. Perscrutei mais uma vez o local e sentei-me confortavelmente onde tantas vezes te tive bem junto a mim, onde tantas vezes nos envolvemos, esquecendo tudo à nossa volta. Ali éramos nós e mais ninguém, ali éramos felizes por breves horas. Hoje vou precisar de sentir uma nova melodia que me acorde deste estado de lassidão. Senti a maciez do que me amparava ali confortavelmente, como se voltasse a senti-la contigo. Relembrei momentos e mais momentos que ali passamos, momentos esses que foram tão bons. Recordei também o pior momento que já passámos juntos, aquele momento pior que aterrador, seguramente um dos piores de toda a minha vida, e com o qual posteriormente nos rimos. Fechei os olhos e senti tudo o que foi bom de novo, vi-me ali sentada à tua espera, vi a tua chegada, experimentei o teu toque mais uma vez, contemplei o teu sorriso, senti os teus lábios, escutei as nossas conversas, tudo de novo, tudo a avivar-se na minha alma. Senti todas as notas soltas que compuseram a nossa sinfonia a dois. Abri os olhos para o que me rodeava, era o nada apenas, a asfixiar-me, a libertar-me de impurezas contidas sorrateiramente na minha alma. Fiquei a descortinar que o passado é uma casa fechada, onde só ficam as recordações e de onde só sai a saudade, a nostalgia e a tristeza. Sim, quando abri os olhos não estavas lá, mas foi como se tivesses acabado de sair dali, afinal tinha acabado de te ter junto a mim, ainda que apenas na minha cabeça. Senti uma lágrima afigurar-se furtivamente no canto do olho, mas esforcei-me por não a verter, não mereces que eu derrame sequer uma única gota salgada. Quis-me odiar por ter deixado que tudo chegasse a este ponto, por ter deixado que ver-te ali comigo fosse agora impossível. Hoje quero tocar piano com a fúria de quem só nele encontra a redenção da alma, e pulsar de gáudio por reproduzir uma melodia delicadamente, sem te afigurares nos meus olhos que contemplarão apenas as teclas e o vazio que se encontra à minha volta. Este lugar já não tem sentido sem ti, agora encontro-me aqui como que perdida, já não te distingo em nenhum lugar da minha vida. Hoje aquele lugar teve para mim tanto significado, não me sinto capaz de lá voltar sem ti, e por isso tenho a certeza de que não lá voltarei. Enquanto regresso já levo a melodia entoada na minha cabeça, já a senti percorrer os meus canais auditivos e as pontas dos meus dedos, já meditei nela. Quando chegar ao meu piano de cauda, serei só eu e ele, nada mais. Seremos preto no branco, branco no preto, tecla a tecla, e sentiremos juntos, vibraremos juntos, fruto das notas musicais que irão envolver o ar. Serei só eu e ele, colmatando tudo, esquecendo tudo o que existe para lá destas teclas vibrantes. Hoje preciso mais do meu piano do que de ti, e é bom sentir isso.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Não consigo adormecer. Persegues a minha cabeça dia e noite, sem parar. Questiono tudo, tento encontrar razões para a forma como as coisas acabaram por se desenrolar, procuro uma maneira de te esquecer definitivamente. Mas não consigo, estou farta disto, nunca pensei prender-me tanto a ti, nunca pensei que me fosse custar tanto a tua perda, que nem foi bem perda, porque nunca cheguei a ter-te realmente. Dei-te quase tudo, dava-te ainda mais se fosse preciso. Tu, ora tu, deste-me um pouco de ti e subitamente quebraste esse laço que nos unia, preferiste esquecer que fomos tanto noutros tempos agora idos. Foste um estúpido, eu sabia que o eras, mas ainda não o tinhas sido comigo. Ainda te amo, ainda me custa depreender esta verdade, usar estas palavras tão fortes, apesar do Amo-te estar completamente banalizado. Ainda sofro com a tua ausência, ainda reclamo a amizade finda, ainda procuro restituir um pouco de afecto. Mas ninguém constrói nada sozinho, uma relação por mais simples que seja precisa de dois intervenientes, e já só eu intervenho. Sabes, eu tento a toda a hora esquecer-te, convencer-me de que já não te amo, mas não posso enganar-me a mim própria. Gostava de pelo menos poder dormir e deixar de te ter a vaguear pela minha mente. Se não for pedir muito.

domingo, 19 de abril de 2009

Desabafo

Ver-te assim deitada nessa cama decerto desconfortável, sem conseguires mover o que quer que seja. Lutando segundo a segundo por te manteres viva, por não estragar mais do que já te estragaram. Ver-te a modificar por fora, avolumar graças a esse maldito coma que te induziram. Estamos aqui e não sabemos se nos ouves, se nos pressentes, mas queremos acreditar que sim. Queremos acreditar que sentes a nossa esperança, a nossa convicção de que vais recuperar rapidamente, de que estarás entre nós depressa a sorrir como sempre te vimos. Quando não estamos à espera de que as coisas aconteçam é sempre mais difícil aceitá-las. Uma fracção de segundos chegou para te atirar para esta maldita cama, onde agora te vemos, restritivamente. Um simples ou complexo choque, o medo, o pânico a correr nas tuas veias misturando-se com o sangue que corria freneticamente, a pancada, tudo desfeito à tua volta, o som das sirenes girando velozmente na sua corrida contra o tempo. E tu ali imóvel, assistindo a tudo confusamente, sem perceber o que tinha acontecido. Todos encurralados, tu a pior, a que sofreu mais com o embate. Agora vejo-me aqui a abraçar a tua filha, contigo aí sem saber se nos estás a sentir aqui a torcer por ti. Ela chora no meu ombro, ela sente tanto a tua falta e vai ter de ir para longe e deixar-te aqui. E eu choro com ela, é demasiado duro ver-te assim, e sentir o mal-estar dela, e pensar que poderia ser eu no lugar dela, e saber que nunca terás a mesma vida que tinhas. Ela agarra-se a mim com força e eu procuro todas as minhas forças para lhe dar o apoio que sei que ela tanto necessita. E tu continuas aí impávida e serena, como se nada tivesse acontecido, não fossem todas as mazelas que conseguimos identificar em ti, apesar do lençol que te encobre. Vejo-te assim dependente de máquinas para viveres, alimentada por tubos de plástico, toda sedada, com os arranhões misturando-se com os furinhos das agulhas. É duro, é muito duro, mas necessito descrever este desassossego em que fiquei depois de te ver, depois de agarrar a tua filha agora frágil nos meus braços, depois de ver todos eles chorando ou tentando não o fazer, enquanto aguardam as notícias que os homens de branco trazem uma única vez por dia. Esta sala de espera tornou-se para os teus filhos e marido a segunda casa. E sei que a qualquer hora que apareça para te ver com os meus pais, os encontrarei sempre lá, bem perto de ti, aguardando novas boas notícias. Dói para mim que sempre gostei de ti e ainda mais da tua filha, e dói ainda mais para os meus pais para quem és como irmã. O vosso grupo está desfeito, os amigos procuram notícias a toda a hora, o telemóvel toca ininterruptamente. A vida às vezes é tão injusta, nunca ias com eles, insististe três vezes para não ires, e logo no dia em que vais, tens o raio do acidente. É como que as coisas estejam predestinadas e não há como lutar contra isso. Esta noite sonhei contigo, estavas a vir cá a casa como tantas vezes fizeste, já curada, sorrias como sempre e todos estávamos felizes por estarmos todos juntos como tantas vezes acontece. Foi só um sonho, mas eu sei que em breve vai ser realidade. Vais ficar bem, nós sabemos que sim.

Estamos todos contigo, Amélia :$

Precisava deste grande desabafo . Desculpem .